domingo, 29 de julho de 2018

Tropicália: os 50 anos de um movimento mais que musical

O movimento da "Tropicália" foi muito mais abrangente que, tão somente, o lançamento do LP "Tropicália" ou "Panis et Circenses", como também ficou conhecida esta obra (e como fica bem clara na capa do próprio LP). Digo isso pois este artigo, mesmo sendo sobre os 50 anos do lançamento deste LP (ocorrido em fins de julho de 1968), também acaba fazendo uma análise não somente do LP - mas também sobre o que este movimento trouxe para o futuro, bem como sobre seus pretensos antecedentes...

  
O movimento da "Tropicália" foi muito mais abrangente que, tão somente, o lançamento do LP "Tropicália" (ou "Panis et Circenses", como também ficou conhecida esta obra). E, ao analisarmos tudo isso, vemos que o LP (bem como o próprio movimento advindo deste), não era algo realmente "novo", digamos assim. Digo isso pois o movimento teve início bem antes, podendo ser considerado como uma "ponta do iceberg" de algo que nasceu anteriormente (não sendo, também, algo que estava somente ligado à música). Tá difícil de se entender? Bom, visando um melhor entendimento disso tudo, veremos - à seguir - uma explicação do que se disse logo acima...




Podemos dizer que o movimento da "Tropicália" nasceu ainda no início do século XX - mais precisamente no final dos Anos 1920 - no período do Pós-Modernismo (alguns anos depois dos eventos da "Semana de Arte Moderna de 1922"). E, sendo mais preciso ainda: sua data de nascimento seria a do lançamento da "Revista de Antropofagia", em 1928, por um dos 'papas' do Modernismo tupiniquim: Oswald de Andrade. O seu nome se deve ao fato de Oswald ter para si que as artes, no Brasil, deveriam deglutir - comer, mesmo - tudo o que podia, de outras culturas (seja, elas quais fossem, mas, em especial, a cultura europeia). Bom, se levarmos isso em consideração, podemos dizer que o movimento da "Tropicália" nasceu 40 anos antes do lançamento do LP...



Um ano antes do lançamento do LP Tropicália, em 1967, o artista plástico Hélio Oiticica concebeu uma instalação, cujo nome dado foi "Tropicália", sendo que por esse motivo muitos dizem ter sido dessa obra que o nome do LP saiu (bem como, por extensão, o nome do próprio movimento). A obra remete ao conceito do tropical, bem como à pobreza dos trópicos (sendo a instalação um grande labirinto, que tem grande semelhança com as favelas, e que era percorrido a pé, onde se pisava em materiais como areia e brita). Ao final do percurso, deparava-se com um aparelho de TV ligado (uma conotação para o moderno imperialismo que domina as pobres regiões tropicais).




Também pode-se dizer que essa troca frutífera entre o Modernismo dos Anos 1920 e o movimento da Tropicália ocorreu no teatro (sendo bem contemporâneo ao lançamento do LP), uma vez que, ainda em 1967, foi encenado (pela primeira vez num palco), a peça "O Rei da Vela", de autoria de Oswald de Andrade - de novo ele - encenada no Teatro Oficina (em São Paulo), e dirigida por José Celso Martinez Corrêa (sendo uma das peças mais odiadas pela Ditadura Militar).



Tropicália acabou sendo um projeto musical, capturado pela gravação do LP homônimo, mas acabou se estendendo para bem mais além disso. Podemos dizer que muitos movimentos culturais - contemporâneos a ele ou nascidos mais adiante - beberam da fonte tropicalista. Um dos mais lembrados - e celebrados - é o próprio movimento cinematográfico do "Cinema Novo", onde muitos diretores passearam por temáticas ligadas ao tropicalismo. Um bom exemplo disso é o filme de Joaquim Pedro de Andrade, lançado em 1969 (ou seja, um ano depois do LP), "Macunaíma". Quer mais tropicalista que esta fábula filmada nos sertões tropicais do Brasil, com personagens tão folclóricos como o são?? E, um detalhe importantíssimo: Macunaíma foi baseado na obra literária de Mário de Andrade (outro modernista de 1922 e grande amigo e parceiro do próprio Oswald de Andrade, citado mais acima).



Nada mais justo e correto que façamos - 50 anos depois - uma grande homenagem (com estudos e pesquisas das mais estimulantes), sobre a obra "Tropicália" (bem como do movimento que dela se originou), afinal isso não foi somente um LP. E, por falar nele, segue abaixo os dados discográficos da obra:

Envolveram-se no projeto muitos músicos, sendo que dentre os principais estão: Caetano Veloso, Gilberto Gil, Gal Costa, Tom Zé, Os Mutantes, Torquato Neto, Nara Leão e Jorge Ben.

Músicas: 

Lado A -
1- Miserere Nóbis - Autoria: Gilberto Gil e Capinam - Intérprete: Gilberto Gil
2- Coração Materno - Autoria: Vicente Celestino - Intérprete: Caetano Veloso
3- Panis et Circencis - Autoria: Caetano Veloso e Gilberto Gil - Intérprete: Os Mutantes
4- Lindoneia - Autoria: Caetano Veloso - Intérprete: Nara Leão 
5- Parque Industrial - Autoria: Tom Zé - Intérpretes: Caetano Veloso, Gilberto Gil, Gal Costa, Os Mutantes e Tom Zé
6- Geleia Geral - Autoria: Torquato Neto e Gilberto Gil - Intérprete: Gilberto Gil

Lado B -
1- Baby - Autoria: Caetano Veloso - Intérpretes: Caetano Veloso e Gal Costa
2- Três Caravelas (Las Tres Carabelas) - Autoria: Moreau Algueró Jr. (Versão: João de Barro) - Intérpretes: Caetano Veloso e Gilberto Gil
3- Enquanto seu Lobo não vem - Autoria: Caetano Veloso - Intérpretes: Caetano Veloso, Gilberto Gil e Rita Lee
4- Mamãe Coragem - Autoria: Caetano Veloso e Torquato Neto - Intérprete: Gal Costa
5- Bat Macumba - Autoria: Caetano Veloso e Gilberto Gil - Intérpretes: Caetano Veloso, Gilberto Gil, Gal Costa e Os Mutantes
6- Hino ao Senhor do Bonfim - Autoria: Artur de Sales e João Antonio Wanderley - Intérpretes: Caetano Veloso, Gilberto Gil, Gal Costa e Os Mutantes



Espero, com este pequeno artigo, ter conseguido mostrar a magnitude do movimento da Tropicália - que, como pode ser visto aqui, mesmo que de uma forma bem rápida - o quanto devemos a este efêmero movimento cultural (que lançou bases bem sólidas em nossa cultura e sociedade), há 50 anos atrás...