Este artigo se presta a fazer uma análise da Ciência durante o século XIX através da Literatura inglesa, mais especificamente da literatura de Terror Gótico, analisando a publicação das duas maiores e máximas obras do gênero: Frankenstein, de Mary Shelley, publicado em 1818, e Drácula, de Bram Stoker, publicado em 1897.
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Primeiramente falemos um pouco da obra da inglesa Mary Shelley, Frankenstein. Nela, um homem extremamente apaixonado pela Ciência, Victor Frankenstein (que dá título à obra, já que o monstro, a quem muitos nomeiam, erroneamente, Frankenstein, não tem nome, sendo essa uma das coisas que seu criador lhe havia negado), acaba por iniciar uma busca desenfreada por conhecimento, buscando vencer a morte, através da descoberta do segredo da vida, visando tentar recriar a mesma, fato que acaba por conseguir, como se verá nas páginas do livro...
Em Frankenstein (publicado pela primeira vez em 1 de janeiro de 1818), a Ciência é algo ainda bastante obscuro, algo muito mais a se temer do que a se dignificar ou mesmo se idolatrar. Nesse início do século XIX, com a Revolução Industrial tendo se iniciado em meados do século XVIII - portanto, há meros 60 ou 70 anos da publicação do livro em questão - portanto, ainda em seu primeiro momento, onde a energia principal é à vapor, e onde a indústria e a Ciência iá caminham juntas, porém a passos ainda inseguros, sendo os seus frutos ainda incertos (até mesmo a eletricidade ainda é algo muito novo). Daí se apresentar o cientista como compelido a um grande fanatismo pela Ciência - um protótipo do que evoluirá no arquétipo do "cientista maluco" - de um tipo de cientista que não mede esforços em prol da Ciência e do conhecimento, sendo até antiético, ou mesmo sem escrúpulos. É quando se chega no momento de recriação da vida, de quando o cientista consegue insuflar vida à um corpo disforme, composto de várias partes de diversos cadáveres, pegos à noite em cemitérios ou roubados de necrotérios. Porém, esse momento não tem nada de mágico, pois é quando o jovem cientista cai em si e vê o tamanho da atrocidade que cometeu (e tudo em prol de uma pseudo-ciência). Neste livro, portanto, o verdadeiro vilão da história é a Ciência...
Já mais tarde, ainda na primeira metade do século XX, Frankenstein será cultuado - e, muitas vezes, terá a ideia original do livro alterada - sendo a imagem criada por Boris Karloff, no filme "Frankenstein", de 1931, seu ícone mais apurado por muito tempo...
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E, por fim, falemos algo da obra do escocês Bram Stoker, Drácula. Neste livro, um grupo de homens - alguns ícones da Era Vitoriana mais um rústico texano - que, no final do século XIX, devem vencer um ser ancestral, uma lenda do mal na figura de um vampiro com vários séculos de existência, um ser maléfico criado por algum tipo de magia negra, um ente demoníaco. Porém, ele é também alguém de estirpe, um grande senhor aristocrático - já que Conde - mas que é também um ser assustador, tão assustador que a própria Ciência dificilmente conseguiria explicar a sua própria existência. Mas, possivelmente, será essa mesma Ciência que poderá ter alguma chance de vencer este ser abjeto, esse terrível sugador de sangue, e, o pior (ao menos pelo prisma político): ele é também um membro do Antigo Regime - outra vez: já que Conde. E é à essa grandiloquente luta, desses cavalheiros ingleses com um americano contra o horrendo vampiro da Transilvânia, no longínquo leste europeu, uma batalha do bem contra o mal que será presenciada nas páginas desse estupendo livro...
Em Drácula (publicado pela primeira vez em 26 de maio de 1897), a Ciência é o grande bastião da modernidade (para usarmos termos do momento histórico ora analisado), e tudo pode ser resolvido ou descoberto por ela. Nesse final do século XIX (com o século XX vindo "logo ali"), e com a Revolução Industrial já tendo entrado em um segundo momento - onde a eletricidade é a nova energia principal utilizada - a indústria e a Ciência caminham juntas e estão vivendo um casamento prolífico e feliz. Daí o cientista apresentado - o médico Abraham Van Helsing - ser mostrado como alguém confiável e que busca um tipo de verdade que libertará os envolvidos na trama; mas, mesmo assim, ele não é um fanático, não precisando ser, para isso, algo como antiético ou mesmo sem escrúpulos. Em contrapartida, o conde Drácula é sinônimo de tudo que é atrasado, anti-moderno ou mesmo extremamente antiquado, desde as mínimas coisas (precisando até da decrépita terra da Transilvânia para seu sono sobrenatural). Ou seja, diferente da primeira obra, neste livro, a Ciência é a verdadeira heroína da história...
E, já mais tarde, também na primeira metade do século XX, se inicia a carreira de Drácula como produto cultural que será extremamente cultuado - e, também, terá a sua ideia original do livro sendo alterada - tendo na imagem criada por Bela Lugosi, no filme "Drácula", também de 1931, uma das caracterizações mais bem criadas e produzidas do vampiro...
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Tornarem-se personagens tão conhecidos da cultura mundial, encontrados em muitas fantasias, de várias festas de Halloween, bem como nos cinemas, teatros e histórias em quadrinhos, foi só uma questão de tempo, coisa que esses seres míticos com suas existências imortais tem de sobra, não é mesmo?...